A recente operação policial denominada “Kairos” trouxe à tona uma realidade alarmante no mundo do fisiculturismo e da busca por resultados rápidos na musculação: a produção e distribuição de substâncias anabolizantes ilegais. O caso chocou não apenas pela extensão da rede criminosa, mas principalmente pela composição perigosa dos produtos comercializados.

A descoberta chocante

As autoridades ficaram surpresas ao descobrir que os anabolizantes caseiros produzidos pela quadrilha continham ingredientes potencialmente nocivos. Entre os componentes encontrados, destacavam-se substâncias utilizadas em produtos para combater insetos, ácaros causadores da sarna e até mesmo piolhos.

A presença de benzoato de metila, um composto químico frequentemente empregado no tratamento de infestações parasitárias, foi confirmada nas fórmulas. Essa revelação levantou sérias preocupações sobre os riscos à saúde dos consumidores desses produtos ilícitos.

A operação Kairos

A ação conjunta da Polícia Civil do Rio de Janeiro e do Ministério Público do Estado resultou na expedição de 15 mandados de prisão, todos cumpridos com sucesso. Além disso, uma pessoa foi detida em flagrante durante a operação.

Um dos aspectos mais intrigantes da investigação foi a captura de um dos suspeitos que se encontrava em um cruzeiro marítimo. A Polícia Federal foi acionada para efetuar a prisão, demonstrando a amplitude e a coordenação entre diferentes órgãos de segurança na execução da operação.

O esquema de produção

Os investigadores descobriram que o grupo criminoso utilizava uma linguagem codificada para se referir à produção dos anabolizantes. A expressão “cozinhar o suco” era comumente empregada para descrever o processo de fabricação das substâncias ilegais.

O delegado responsável pelo caso ressaltou que os laboratórios clandestinos eram montados de forma a simular instalações legítimas, dificultando a identificação de suas atividades ilícitas à primeira vista.

Alcance nacional do esquema

A investigação revelou que a rede de distribuição dos anabolizantes caseiros se estendia por praticamente todo o território nacional. Os produtos eram comercializados em 26 dos 27 estados brasileiros, evidenciando a magnitude da operação criminosa.

As autoridades identificaram diversas marcas associadas ao esquema, todas sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Entre elas, destacavam-se nomes como Next, Thunder Group, Venon, Pharma Bulls, Supreme, Kraft, Phenix e Blank.

Movimentação financeira expressiva

Durante um período de apenas seis meses, a investigação conduzida pela 76ª Delegacia de Polícia identificou uma movimentação financeira surpreendente, chegando a R$ 82 milhões. Esse valor demonstra o lucro expressivo obtido pelo grupo criminoso com a venda dos anabolizantes ilegais.

A comercialização dos produtos era realizada principalmente através de plataformas online e redes sociais, aproveitando-se da facilidade de alcance e da dificuldade de rastreamento proporcionadas pelo ambiente digital.

O papel dos influenciadores

Um aspecto preocupante revelado pela investigação foi o envolvimento de influenciadores digitais na promoção dos anabolizantes caseiros. Muitos desses influenciadores, ligados ao mundo do fisiculturismo e do atletismo, divulgavam as marcas ilegais em suas redes sociais, ampliando o alcance e a credibilidade dos produtos junto ao público-alvo.

As autoridades alertaram que a investigação continuará, visando identificar e responsabilizar não apenas os produtores e distribuidores diretos, mas também aqueles que contribuíram para a disseminação dos produtos através de propaganda e divulgação.

O líder da organização

Miguel Barbosa de Souza Costa Júnior, conhecido pelo codinome “Boss”, foi identificado como o líder da organização criminosa. Ele foi detido em uma residência de alto padrão localizada em São Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro. Sua esposa, Aiane, também foi presa durante a operação.

As investigações revelaram que o “Boss” não apenas comandava a produção e distribuição dos anabolizantes, mas também compartilhava conhecimentos sobre a fabricação das substâncias ilegais com terceiros, expandindo assim a rede de produção clandestina.

Estratégias de proteção

A residência onde o líder da quadrilha foi capturado chamou a atenção dos agentes pela presença de placas com mensagens intimidadoras. Uma delas advertia que invasores seriam “alvejados” e que sobreviventes receberiam o mesmo tratamento novamente. Outra placa fazia uma analogia controversa com o Supremo Tribunal Federal, sugerindo que dentro da propriedade, eles “acusavam, julgavam e executavam a pena”.

Essas táticas de intimidação demonstram o nível de organização e a mentalidade do grupo criminoso, que buscava proteger suas operações através da ameaça e da criação de um ambiente de medo.

Dimensão da operação policial

A operação Kairos não se limitou apenas às prisões. Foram cumpridos 23 mandados de busca e apreensão no Rio de Janeiro e no Distrito Federal, além de 8 mandados de medidas cautelares diversas da prisão. Essas ações visavam não apenas a captura dos envolvidos, mas também a coleta de provas e a desarticulação completa da rede de produção e distribuição.

No total, 23 pessoas foram denunciadas pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco/MPRJ) por diversos crimes, incluindo associação criminosa, crime contra a saúde pública e crimes contra as relações de consumo.

Impacto no mercado ilegal

As autoridades estimam que o grupo desmantelado pela operação Kairos seja possivelmente o maior do país em termos de revenda de anabolizantes clandestinos. O delegado responsável pelo caso enfatizou que a movimentação financeira real é provavelmente muito superior aos R$ 82 milhões inicialmente identificados.

A investigação também revelou que o grupo investia pesadamente em marketing, chegando a pagar até R$ 10 mil para influenciadores digitais promoverem suas marcas ilegais. Essa estratégia de marketing agressiva contribuía para a ampla disseminação dos produtos no mercado consumidor.

pessoa segurando uma seringa com anabolizante
Polícia e MP revelam riscos de anabolizantes clandestinos com substâncias nocivas à saúde. Imagem: Freepik

Riscos à saúde pública

A descoberta da presença de substâncias como repelentes de insetos e medicamentos contra sarna e piolhos na composição dos anabolizantes caseiros ressalta o grave risco à saúde pública representado por esses produtos. Os consumidores, muitas vezes em busca de resultados rápidos no ganho de massa muscular, estavam inadvertidamente expondo-se a compostos químicos potencialmente perigosos.

As autoridades de saúde alertam para os perigos do uso de anabolizantes sem supervisão médica, especialmente aqueles de origem desconhecida ou ilegal. Os riscos vão desde problemas hepáticos e cardíacos até desequilíbrios hormonais graves e irreversíveis.

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