A prevenção do HIV acaba de dar um salto histórico. A Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou nesta segunda-feira (14/7) a recomendação do lenacapavir injetável como forma de prevenir o HIV. A injeção semestral tem eficácia igual ou superior aos 99% dos comprimidos diários atualmente distribuídos no Brasil como profilaxia pré-exposição (PrEP). O anúncio representa uma revolução no combate ao vírus que ainda afeta milhões de pessoas ao redor do mundo.

O anúncio foi feito durante a 13ª Conferência da Sociedade Internacional de Aids, realizada em Kigali, Ruanda. O lenacapavir é o primeiro antirretroviral injetável e, para a OMS, ele pode popularizar a adesão à PrEP. Com apenas duas aplicações anuais, o novo medicamento promete transformar a forma como milhões de pessoas se protegem contra o HIV.

O que é o lenacapavir e como funciona

O lenacapavir representa uma inovação significativa no campo dos antirretrovirais. Desenvolvido pela farmacêutica Gilead Sciences, sediada nos EUA, o lenacapavir já era comercializado no país norte-americano desde 2022, mas indicado apenas para pessoas infectadas com resistência a antirretrovirais comuns.

O lenacapavir pertence à classe dos inibidores de cápside, uma abordagem inovadora no tratamento e prevenção do HIV. O medicamento atua por um mecanismo diferente: enquanto a maioria dos antirretrovirais interfere na produção do material genético do HIV, o lenacapavir impede a formação do chamado capsídeo, estrutura que guarda o RNA do vírus e possibilita sua entrada no interior das células.

Imagem de um laço vermelho, símbolo de conscientização sobre o HIV, representando as campanhas de prevenção.
Conscientização sobre o HIV, e a importância de métodos de prevenção como o lenacapavir. Imagem: Pinterest.

Mecanismo de ação prolongada

Projetado para ser armazenado no tecido adiposo do usuário (sobretudo no abdômen, onde a injeção é geralmente aplicada), o lenacapavir é liberado de forma lenta no organismo, garantindo sua ação por até seis meses. Como essa estrutura é fundamental para o ciclo de vida do HIV, o medicamento atua bloqueando tanto a formação quanto a quebra dessa cápsula, o que impede a replicação do HIV no organismo.

Estudos clínicos comprovam eficácia superior

A aprovação da OMS baseou-se em resultados impressionantes de estudos clínicos rigorosos. Cinco ensaios clínicos estão em andamento, sendo que dois deles – PURPOSE 1 e PURPOSE 2 – já apresentaram resultados preliminares.

PURPOSE 1: 100% de eficácia em mulheres

O PURPOSE 1 acompanhou 2.134 mulheres cisgênero na África do Sul e em Uganda, com eficácia de 100% na prevenção do HIV entre as voluntárias. Este resultado excepcional demonstrou o potencial do medicamento em populações de alto risco.

PURPOSE 2: Eficácia de 99,9% em população diversa

Já o PURPOSE 2 incluiu 2.179 homens e mulheres nos EUA, Argentina, México, Peru, Porto Rico, África do Sul, Tailândia e Brasil, e registrou apenas dois casos de infecção pelo HIV, indicando eficácia de 99,9%. A análise comprovou a eficácia superior do lenacapavir em comparação com a PrEP oral diária baseada no Truvada.

Vantagens sobre os métodos atuais de prevenção

A grande revolução do lenacapavir está na praticidade e na adesão ao tratamento. Atualmente, as opções disponíveis incluem:

“A grande vantagem do lenacapavir é a sua posologia [forma de uso]. A adesão ao tratamento preventivo é facilitada, à medida que ele exige apenas duas doses de uma injeção, espaçadas por seis meses cada”, explica o infectologista Moacyr Silva Junior, do Einstein Hospital Israelita.

Redução das barreiras de adesão

O LEN é uma opção injetável a cada seis meses e pode ser especialmente atraente para pessoas que preferem menos visitas à clínica ou que enfrentam dificuldades com a PrEP oral diária. Ele pode melhorar a adesão e alcançar mais pessoas que precisam de prevenção contra o HIV, inclusive grávidas e lactantes.

Como será a implementação global

“É a melhor opção disponível enquanto aguardamos uma vacina contra o HIV. A OMS está comprometida em trabalhar com países e parceiros para garantir que essa inovação chegue às comunidades o mais rápido e seguro possível”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.

Recomendações da OMS para implementação

“A primeira recomendação é que o lenacapavir, uma injeção de ação prolongada, seja oferecido como mais uma opção de prevenção para pessoas em risco de HIV, como parte de uma estratégia combinada de prevenção. Trata-se de uma recomendação forte, com nível moderado a alto de certeza nas evidências”, explicou Doherty.

A OMS pede que países e organizações internacionais comecem a implementar o lenacapavir de forma imediata. Além da aplicação, será necessário monitorar a aceitação, adesão e impacto da medida nos programas nacionais de prevenção.

Situação do lenacapavir no Brasil

No contexto brasileiro, o cenário ainda está em desenvolvimento. No Brasil, a única opção disponível até o momento é a via oral, com comprimidos que devem ser tomados diariamente por pessoas com risco contínuo de exposição ao vírus. No total, de acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil tem 124,8 mil usuários do Prep.

Processo regulatório no país

Dois pedidos de registro de medicamentos com o princípio ativo lenacapavir estão em análise na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária): um em forma de solução injetável e outro em comprimidos.

O Ministério da Saúde diz que acompanha com atenção os avanços tecnológicos de novos medicamentos voltados à prevenção e ao tratamento da infecção pelo HIV e da Aids, mas que precisa esperar a avaliação da Anvisa para uma possível incorporação do medicamento ao SUS.

Desafios de acesso e custos

Um dos principais obstáculos para a implementação global do lenacapavir é o custo elevado. Nos EUA, até o momento o único país a aprovar o lenacapavir para prevenção, o preço de tabela anual do medicamento é de US$ 28.218.

Iniciativas para redução de custos

A farmacêutica Gilead Sciences, fabricante do lenacapavir, anunciou na quarta-feira (10) que firmou um acordo com o Fundo Global para fornecer o medicamento para prevenção do HIV sem fins lucrativos. Pelo acordo, o preço do lenacapavir refletirá apenas os custos de produção e distribuição.

“Estamos fornecendo o medicamento sem lucro para a Gilead e em quantidade suficiente para alcançar até dois milhões de pessoas em países de baixa e média renda antes que versões genéricas do lenacapavir estejam disponíveis”, afirmou o presidente da empresa, Daniel O’Day.

Impacto potencial na epidemia de HIV

O lenacapavir pode “mudar fundamentalmente a trajetória da epidemia de HIV”, mas isso só será possível se chegar a quem mais precisa, afirmou Peter Sands, diretor executivo do Fundo Global.

Populações prioritárias

O remédio é especialmente indicado para profissionais do sexo, homossexuais, usuários de drogas, pessoas trans, presos e adolescentes que estão iniciando sua vida sexual. Para informações sobre prevenção e tratamentos disponíveis, consulte sempre fontes confiáveis como o site Bula Remédio.

Cenário global preocupante

O HIV é transmitido principalmente por meio de relações sexuais sem proteção ou pelo compartilhamento de agulhas. O vírus ataca o sistema imunológico e, sem tratamento, pode evoluir para a síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids). Segundo a OMS, cerca de 40 milhões de pessoas viviam com HIV no mundo até o fim de 2023.

O futuro da prevenção do HIV

“A ciência hoje já oferece as ferramentas para erradicar a aids como ameaça à saúde pública. O que precisamos agora é de uma implementação ousada dessas recomendações, fundamentadas na equidade e impulsionadas pelas comunidades”, concluiu a diretora Meg Doherty, do programa global de HIV da OMS.

A recomendação da OMS marca um momento decisivo na luta contra o HIV.

Dúvidas Frequentes

O lenacapavir já está disponível no Brasil?

Ainda não. Dois pedidos de registro de medicamentos com o princípio ativo lenacapavir estão em análise na Anvisa, mas ainda não há previsão de quando estará disponível no país.

Qual a diferença entre o lenacapavir e a PrEP oral atual?

A principal diferença está na frequência de uso. Enquanto a PrEP oral exige comprimidos diários, o lenacapavir requer apenas duas injeções por ano, facilitando significativamente a adesão ao tratamento.

Quem pode usar o lenacapavir como prevenção?

O medicamento é indicado para pessoas em risco de infecção pelo HIV, incluindo profissionais do sexo, homens que fazem sexo com homens, pessoas trans, usuários de drogas injetáveis e parceiros de pessoas vivendo com HIV.

O lenacapavir substitui o uso de preservativos?

Não. É importante que, mesmo com a PrEP, a camisinha continue a ser usada nas relações sexuais: o medicamento não previne a gravidez e nem a transmissão de outras doenças sexualmente transmissíveis, como clamídia, gonorreia e sífilis.

Qual a eficácia do lenacapavir na prevenção do HIV?

Os estudos clínicos demonstraram eficácia entre 96% e 100%, dependendo da população estudada, sendo considerado altamente eficaz na prevenção da infecção pelo HIV.

O lenacapavir será oferecido pelo SUS?

O Ministério da Saúde diz que acompanha com atenção os avanços tecnológicos de novos medicamentos voltados à prevenção e ao tratamento da infecção pelo HIV e da Aids, mas que precisa esperar a avaliação da Anvisa para uma possível incorporação do medicamento ao SUS.

Como funciona o mecanismo de ação do lenacapavir?

O lenacapavir impede a formação do chamado capsídeo, estrutura que guarda o RNA do vírus e possibilita sua entrada no interior das células, bloqueando assim a replicação do HIV no organismo.

Há efeitos colaterais conhecidos?

Segundo os estudos clínicos, o medicamento foi bem tolerado, mas como qualquer medicamento, pode apresentar efeitos adversos. É importante consultar um profissional de saúde para avaliar riscos e benefícios individuais.

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