O mundo dos crimes reais exerce um magnetismo sobre muitos indivíduos. Editoras especializadas, podcasts investigativos, filmes e séries em plataformas de streaming muito famosas, são apenas alguns exemplos que refletem o crescente espaço conquistado pelo gênero “true crime” na mídia contemporânea.
Se você é um dos muitos que se sente atraído por esse assunto e deseja compreender as razões por trás dessa tendência crescente, a psicologia tem respostas reveladoras. A seguir, entenda o universo dos crimes reais, os fatores que influenciam o consumo desse tipo de conteúdo e muito mais.
O que são crimes reais?
Personagens como Dexter, Ted Bundy ou Jack, o Estripador, são apenas alguns dos nomes que representam assassinos que existiram além da ficção. O gênero “true crime” envolve esses e outros criminosos reais cujos casos, devido à sua fama e peculiaridades no envolvimento com suas vítimas, foram retratados na televisão, no cinema e em outras mídias.
Enquanto algumas pessoas evitam se informar sobre relatos brutais, outras se sentem fascinadas pelos detalhes de cada evento. Como o mestre do terror, Stephen King, afirma em seu livro “Sombras da Noite” (2012), a maioria das pessoas tem, na mesma medida, interesse, curiosidade e repulsa por eventos macabros. É uma curiosidade pelo inexplicável e pelos mistérios da mente humana que impulsiona esse fascínio.
A mídia, por sua vez, percebe esse interesse e transforma esses acontecimentos em conteúdos a serem consumidos, muitas vezes com grande sucesso.
A ascensão das produções sobre crimes reais
Os crimes reais, ousados e destinados a chamar a atenção, têm ganhado um espaço significativo na televisão, no cinema e na literatura. Mesmo casos do Brasil ganharam repercussão além dos jornais, como o Caso Richthofen, que se transformou em um filme dividido em duas partes com perspectivas diferentes de um mesmo acontecimento: “A menina que matou os pais” e “O menino que matou meus pais”.
Illana Casoy, autora e criminóloga, comenta que a curiosidade pela mente humana impulsiona o aumento na procura por títulos do gênero “true crime”, justificando a demanda por investimentos nesse mercado de entretenimento.
Por que as pessoas se interessam por crimes reais?
Os delitos reais já alcançaram um lugar especial na mente de diversas pessoas. Além dos elementos de suspense e mistério que nos estimulam a saber mais sobre os casos, como se estivéssemos investigando junto com a polícia ou envolvidos diretamente, existem outras justificativas psicológicas para esse fascínio.
Primeiramente, de acordo com psicólogos e psiquiatras especializados no tema, há alguns motivos pelos quais as pessoas apreciam casos criminais, como o sensacionalismo promovido pela mídia, que trata criminosos como celebridades a serem acompanhadas.
Adicionalmente, há o prazer na punição que o criminoso receberá. Desde os tempos antigos, estamos habituados a ver indivíduos sendo punidos por seus delitos, tal como acontecia na história com as execuções em praça pública. Isso proporciona um sentimento de tranquilidade de que a “justiça foi feita”.
Segundo psicólogos, há também um certo mecanismo em nossas mentes que alivia a violência que existe dentro de todos nós quando consumimos conteúdos do gênero “true crime”. Da mesma forma que os filmes de praia nos tranquilizam ou os românticos liberam sentimentos de amor, os violentos desencadeiam nossa violência interna de maneira segura, liberando até mesmo hormônios, como a adrenalina.
O grande interesse feminino pelos crimes reais
Curiosamente, pesquisas indicam que existe um público específico que se interessa mais pelo gênero “true crime”: as mulheres. De acordo com especialistas, o motivo está ligado ao fato de que a maioria das vítimas desses crimes são mulheres.
Isso permite que haja um reconhecimento, já que muitas mulheres já passaram, estão passando ou têm medo de experimentar situações de agressão e manipulação por parte de homens, tal como as vítimas das narrativas relatadas.
Ademais, em seus relatos, elas declaram que observar a conduta dos criminosos em filmes e documentários é um meio de aprender a se defender. É como se ao assistir aos casos as mulheres conseguissem orientações práticas sobre o que evitar.
Os benefícios e riscos de apreciar crimes reais
A verdade é que crimes não são coisas boas. São violentos e retratam situações que podem acontecer com qualquer um. No entanto, dar destaque a alguns crimes reais pode fazer com que casos não solucionados ganhem atenção suficiente para serem reabertos e resolvidos.
Um exemplo disso é o assassinato de Jackie Hogue, mostrado pela série de investigação “Cold Justice”, que gerou uma nova investigação do caso e descobriu novas evidências que apontaram o marido de Jackie como culpado pela morte.
Então, afinal, apreciar “true crimes” faz mal ou não? A resposta depende de como você reage ao que consome. Se assistir conteúdos criminosos te causa muito medo, pode não valer a pena devido a gatilhos, paranoias, traumas e afins. Por outro lado, se você acredita que não te traz problemas e, após terminar o conteúdo, sua mente permanece tranquila, tudo bem.
Contudo, existe algo que requer muita atenção. Isso ocorre quando começamos a perceber uma certa romantização desses casos criminais. Portanto, é essencial ter cautela e compreender que pessoas reais passaram por essas situações, e de maneira alguma, podemos converter criminosos em celebridades.
O problema da romantização de crimes reais
A adaptação da Netflix sobre os crimes de Jeffrey Dahmer viralizou e, inclusive, gerou alguns escândalos sobre até que ponto essas histórias devem ser vendidas e reduzidas a meros espetáculos.
Algumas situações como essa ilustram o problema da glorificação de crimes reais: a idolatria que, consequentemente, leva à banalização desses casos.
Embora existam adaptações sobre crimes que nos ajudam a compreender a desigualdade, o preconceito, a injustiça e até um sistema judiciário ineficiente na sociedade atual, existem também adaptações que não honram as vítimas, distorcem os fatos e romantizam os criminosos.
Em conclusão, esses crimes reais mal-adaptados servem apenas para lucrar ao nos enganar e fazer com que admiremos coisas que merecem repúdio, pois não estão conforme a justiça e com a verdade.
Como consumir e lidar com crimes reais de forma responsável
Ao consumir e lidar com o gênero “true crime”, precisamos fazer algumas perguntas a nós mesmos: essas obras são informativas ou apenas persuasivas? Qual é o efeito desses conteúdos em quem os vê? Esses “crimes autênticos” podem ser utilizados como ferramentas eficazes para combater a violência?
Um “true crime” abordado da forma correta sempre mostrará a perspectiva da vítima ou do crime, e não um lado tendencioso do criminoso.
Em resumo, ao assistir conteúdos de true crime, é importante ter cuidado para evitar possíveis impactos negativos na saúde mental e na percepção de segurança. Embora essas histórias possam ser fascinantes, elas geralmente envolvem temas pesados como violência, trauma e sofrimento, o que pode gerar ansiedade, medo ou até dessensibilização ao sofrimento alheio. Além disso, é essencial lembrar que essas narrativas são editadas para entretenimento e podem não refletir toda a complexidade dos casos, o que pode distorcer a compreensão sobre a justiça criminal. Consumir true crime com discernimento ajuda a manter um equilíbrio saudável entre o interesse pelo tema e o bem-estar emocional.